Ambos
eram meus amigos. E a história deles não é diferente de outras histórias: é só
mais uma história de quase amor, de quase vida e de total traição.
João
era mais velho, o que, por si só, já sugeria alguns benefícios, como conforto e
proteção. Maria, uma jovem bela, era, para João, uma jovem bela.
Não
quero que pensem que estou do lado de um nem de outro. Na verdade, eu não
ficaria com nenhum. Acho João presunçoso, cuidadoso e quieto demais, do tipo
que não dança, não se embriaga e não dirige em alta velocidade. Chatice da
idade, talvez! Maria, por sua vez, é cheia de vida. Até demais pra meu gosto.
Daquelas que vivem tanto o momento, que não sobrará nada para depois.
No
início, como se espera de qualquer relacionamento, era tudo muito bom: troca de
elogios, café na cama, torpedos o dia inteiro, postagens românticas no
facebook, senhas compartilhadas, sexo frequente. Depois de alguns meses, senhas
individuais, defeitos, discussões, xingamentos, ausência de sexo (pelo menos entre
si!) – silêncio. Para Maria, não parecia
mais legal estar com um “ velhote velho!”. Para
João, não era promissor manter-se casado apenas com “colágeno” e “bumbum
empinado”.
Não
demorou para João envolver-se com várias
mulheres – mais novas, claro! Enquanto Maria, vez por outra, mantinha um
amante. Após uma maratona de traições, eles sempre se reencontravam na cama. E
ao reencontro se seguiam pedidos de desculpa, declarações de amor e planos. Mas
não demoravam a vir a desconfiança, as brigas e, de novo, as traições.
Ela
o acusava de ele consumir sua juventude; ele alegava que ela o arruinava moral
e financeiramente.
Ele
me confessou que, das mais de cem
mulheres que teve, todas arrancaram-lhe um pedaço: do sorriso, do tempo, do
bolso, do esforço; entretanto foi Maria quem mais o despiu: do pudor, da calma,
da esperança e da alma. A maldita o apartou do rumo, do prumo, de tudo.
Ela
disse-me, outro dia, que ele extirpou todos os seus sonhos; que depois de João
não haveria de confiar em mais ninguém. E se não confia, não se entrega plenamente.
Se não se entrega, não ama. E se não ama – não vive!
Ele
me dizia: “sabe aquele lance que a serpente fez com Adão, no Paraíso? Comigo
foi bem pior: ela me ofereceu a maçã. Quando eu distraído a comia, ela enfiou a
macieira todinha no meu cu, com folhas, frutas, galhos, tronco e raiz – e ainda
fez ‘hihi!’ . Safada!”.
Ela
me contava: “pensei ter encontrado o príncipe encantado, mas achei foi um sapo
– um sapo velho, nojento – que
vive nos esgotos , que come tudo o que é inseto, que não pode ver uma aranha,
que daria a aposentadoria por uma
perereca”.
Entre tapas e beijos, metáforas e aliterações, mentiras e
mentiras, eles – pelo menos em casa – formavam um não invejável arremedo de
casal. Comiam no quarto, somavam contas no quarto. No quarto se cheiravam, se
amavam, se feriam, se matavam. E lá ainda cabiam sonhos e desencantos, porém
não mais cabiam Maria nem João. E de tanta coisa que ali se amontoava, é de se
esperar que de quarto ali não tinha nada: pois que era inteiro, embora faltasse
muito; pois que era completo, apesar dos
cacos; pois que era tudo, ainda que faltasse um tanto; pois que era o bastante,
mesmo faltando um monte; pois que era suas vidas – estimados leitores –, embora
faltasse vida.

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